Congresso
"Eliistaminar 'ç', 'ch', 'ss' é uma grande besteira", diz linguista
Ideia circula em grupo de estudo do Senado. Embora negue proposta, senador defende revisão do acordo ortográfico que sequer entrou plenamente em vigor
Bianca Bibiano
Grupo de trabalho no Senado vai analisar implantação da reforma ortográfica e propor mais mudanças (Thinkstock/VEJA)
Nesta semana, uma discussão sobre (mais) uma nova reforma ortográfica da língua portuguesa veio a público revelando uma proposta esdrúxula. Segundo a versão que circulou, um grupo do Senado defenderia uma "simplificação" do idioma escrito propondo para isso que palavras grafadas com "ç", "ss", "sc" e "xc" passassem a ser redigidas exclusivamente um "s"; o "h" no início das palavras, por sua vez, seria suprimido — "homem" viraria "omem". Isso evitaria confusões na hora de escrever. O senador Cyro Miranda (PSDB-GO), presidente da Comissão de Educação, Cultura e Esportes do Senado Federal, que de fato debate uma revisão da reforma que entrou em vigor em 2009, nega que defenda a aposentadoria do "ç", "ss", "xc" e assim por diante. "Tudo não passou de um mal-entendido", diz Miranda.
Segundo ele, a proposta é de autoria de Ernani Pimentel, professor de língua portuguesa, dono da rede de cursos preparatórios Vesticon. Pimentel faz parte do grupo de trabalho técnico do Senado formado em 2013 para revisar o acordo ortográfico de 2009. Também fazem parte do grupo os senadores Ana Amélia Lemos (PP-RS) e Cristovam Buarque (PDT-DF) e o também professor Pasquale Cipro Neto. "As ideias do Pimentel não representam a opinião do grupo. Não há nenhuma proposta nesse sentido tramitando na Casa", diz Miranda.
Defendida pelo senador ou não, ideia de mexer no "ç" e no "h" não encontra amparo junto a um dos maiores linguistas do Brasil. "É uma grande besteira. A ortografia é influenciada tanto pela história da língua como por seu registro oral. Ela guarda suas raízes latinas e gregas e não pode ser alterada apenas levando em conta a fala atual", diz Ataliba de Castilho, assessor do Museu da Língua Portuguesa e professor das Universidade de São Paulo (USP) e Estadual de Campinas (Unicamp).
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O linguista questiona ainda um argumento defendido por Pimentel para suprimir "ç" e "h": o de que o corte facilitaria a aprendizagem escolar. "A dificuldade de alfabetizar não diz respeito à grafia das palavras, mas sim ao método de ensino do professor, que precisa ajudar o estudante a compreender as diferenças entre língua falada e escrita. Mudar as letras não muda esse processo."
A última reforma ortográfica entrou em vigor em 2009, introduzindo mudanças como o fim do trema e da acentuação em palavras como ideia e assembleia. Embora escolas, editoras de livros e publicações, entre outros, já tenham assimilado as novas regras, Miranda conseguiu, em 2012, negociar com a presidente Dilma Rousseff o adiamento do prazo final para adoção das novas normas. Ao invés de 1º de janeiro de 2013, o prazo foi prorrogado para 1º de janeiro de 2016.
Vitorioso na primeira empreitada, o senador propôs a criação do grupo de trabalho do qual faz parte Pimentel. O objetivo é rever as normas gramaticais estebelecidas no acordo firmado em 2008 pelas nações da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). E propor mais mudanças. "Há muitas críticas ao fato de que grupos da sociedade, como professores e linguistas, não terem sido consultados sobre as mudanças", diz Miranda. "Faremos reuniões com representantes da CPLP e para criar uma nova proposta de adequação da ortografia e uma votação para saber quais países desejam aderir ou não ao acordo ortográfico."
A discussão não faz sentido algum, na visão de Castilho. "Editoras, imprensa e até empresas de softwares já adaptaram todos os seus produtos, como previa a lei. Continuar discutindo a mudança é desconsiderar o gasto financeiro desse processo", diz. Ele diz ainda que a discussão ignora o trabalho dos linguistas Antonio Houaiss e Malaca Casteleiro, que, na década de 1990, delinearam a proposta da ortografia introduzida em 2009. "Foi um trabalho amplo, com participação da sociedade civil, da academia e do poder público, ao contrário do que diz o grupo de trabalho do Senado."
Ainda que o Senado continue a arquitetar uma contrarreforma ortográfica, pouco poderá ser feito no sentido de mudar o que foi acordado em 1990 e reiterado pelos oito países em 2008. O Instituto Internacional de Língua Portuguesa, órgão da CPLP, é o único responsável por preparar o Vocabulário Ortográfico, documento de referência nos oito países. "Nada poderia ser feito no Congresso brasileiro para mudar esse fato", afirma Castilho.
Disponível em: <https://veja.abril.com.br/noticia/educacao/eliminar-c-ch-ss-e-uma-grande-besteira-diz-linguista> acesso em: 29 Ago. 2014.
O peso da indisciplina e da bagunça em sala de aula
Um em cada cinco minutos do tempo de aula é gasto pedindo silêncio ou chamando a atenção por bagunça e isso deixa o Brasil com a pior produtividade de horas/aula.
Os professores brasileiros gastam, em média, 20% do tempo de aula tentando manter a ordem em classe e, com isso, menos de 70% do tempo de aula é gasto realmente ensinando. As informações são da edição 2013 da Talis, Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem coordenada pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). O levantamento mostra que o desempenho brasileiro é o pior entre os 34 países que responderam a essa parte da pesquisa.
A média de tempo gasto entre os países para manter a disciplina é de 13%. De aula mesmo, o percentual de tempo gasto em sala no Brasil é 67%, contra 79% da média internacional, e 81% da Finlândia, país tido como exemplar no quesito educação. Mais de 100 mil professores responderam à pesquisa. No Brasil, foram 14.291 professores e 1.057 diretores de 1.070 escolas.
Segundo o relatório, professores e alunos poderiam se beneficiar da redução do tempo gasto com tarefas administrativas e com manutenção do clima adequado para a aprendizagem. Nas questões administrativas, como controle de presença, o estudo indica que são gastos 12% do período de cada aula, contra a média de 8% dos países que participaram da pesquisa. Na Finlândia, a tarefa toma 6% do tempo.
Para a professora Neide Coelho Boëchat, coordenadora do curso de Filosofia do UNIFAI Centro Universitário Assunção, a perda de tempo não ocorre apenas no ensino fundamental e médio, mas também nas universidades, consequência da falta de comprometimento com a cultura por parte de professores, alunos, família, governo, enfim, sociedade. “Desenvolvemos a cultura da incultura”, diz, lembrando que comprometimento com cultura não significa manter alunos nas escolas.
Em seu entender, as instituições de ensino e os próprios órgãos governamentais de educação têm se mostrado mais preocupados com questões técnicas, desenvolvimento de habilidades, competências e atitudes dos alunos do que propriamente com a busca do conhecimento. E os professores são levados a despender um tempo extra para cumprir as exigências burocráticas, preenchendo relatórios, resolvendo problemas de faltas, de coisas alheias ao ofício de ensinar. “Quando findam essas questões de ordem prática e burocrática, muito tempo da aula já se perdeu. Aliás, também essa atenção às coisas burocráticas alimenta a indisciplina, a bagunça dos alunos enquanto aguardam o início da aula. É uma coisa levando à outra. E o conhecimento, a cultura viram questões secundárias, como nos atesta mais este estudo da Talis.
Disponível em: <https://www.unifai.edu.br/arquivos/EstudoOCDE.pdf> Acesso em: 29 Ago. 2014.
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Pesquisa põe Brasil em topo de ranking de violência contra professores
Daniela Fernandes
De Paris para a BBC Brasil
Estudo também revelou que também revelou que apenas um em cada dez professores no Brasil acreditam que a profissão é valorizada pela sociedade
Uma pesquisa global feita com mais de 100 mil professores e diretores de escola do segundo ciclo do ensino fundamental e do ensino médio (alunos de 11 a 16 anos) põe o Brasil no topo de um ranking de violência em escolas.
Na enquete da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), 12,5% dos professores ouvidos no Brasil disseram ser vítimas de agressões verbais ou de intimidação de alunos pelo menos uma vez por semana. Trata-se do índice mais alto entre os 34 países pesquisados – a média entre eles é de 3,4%.
Depois do Brasil, vem a Estônia, com 11%, e a Austrália com 9,7%. Na Coreia do Sul, na Malásia e na Romênia, o índice é zero.
“A escola hoje está mais aberta à sociedade. Os alunos levam para a aula seus problemas cotidianos”, disse à BBC Brasil Dirk Van Damme, chefe da divisão de inovação e medição de progressos em educação da OCDE.O estudo internacional sobre professores, ensino e aprendizagem (Talis, na sigla em inglês), também revelou que apenas um em cada dez professores (12,6%) no Brasil acredita que a profissão é valorizada pela sociedade; a média global é de 31%.
O Brasil está entre os dez últimos da lista nesse quesito, que mede a percepção que o professor tem da valorização de sua profissão. O lanterna é a Eslováquia, com 3,9%. Em seguida, estão a França e a Suécia, onde só 4,9% dos professores acham que são devidamente apreciados pela sociedade.
Já na Malásia, quase 84% (83,8%) dos professores acham que a profissão é valorizada. Na sequência vêm Cingapura, com 67,6% e a Coréia do Sul, com 66,5%. A pesquisa ainda indica que, apesar dos problemas, a grande maioria dos professores no mundo se diz satisfeita com o trabalho.
A conclusão da pesquisa é de que os professores gostam de seu trabalho, mas “não se sentem apoiados e reconhecidos pela instituição escolar e se veem desconsiderados pela sociedade em geral”, diz a OCDE.
Segundo Van Damme, “a valorização dos professores é um elemento-chave para desenvolver os sistemas educacionais”.Ele aponta melhores salários e meios financeiros para que a escola funcione corretamente, além de oportunidades de desenvolvimento de carreira como fatores que podem levar a uma valorização concreta da categoria.
No Brasil, segundo dados do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDEs) da Presidência da República, divulgados em junho deste ano, a remuneração média dos professores é de pouco menos de R$ 1,9 mil por mês.
A média salarial dos professores nos países da OCDE, calculada levando em conta o poder de compra em cada país, é de US$ 30 mil (cerca de R$ 68,2 mil) por ano, o equivalente a R$ 5,7 mil por mês, o triplo do que é pago no Brasil.
O especialista da OCDE cita a Coreia do Sul e a China como exemplos de países onde o trabalho dos professores é valorizado tanto pela sociedade quanto por políticas governamentais, o que representa, diz ele, um “elemento fundamental na melhoria da performance dos alunos”.
“Em países asiáticos, os professores possuem um real autoridade pedagógica. Alunos e pais de estudantes não contestam suas decisões ou sanções”, afirma.
A organização ressalta que houve avanços na educação brasileira nos últimos anos. Os investimentos no setor, de 5,9% do PIB no Brasil, estão próximos da média dos países da OCDE (6,1%), que reúne várias economias ricas. “Entre 2000 e 2011, o nível de investimentos em educação no Brasil, em termos de percentual do PIB, quase dobraram”, afirma Van Damme.
Outro indicador considerado importante pela OCDE, o percentual de jovens entre 15 e 19 anos que estudam, é de 77% no Brasil. A média da OCDE é de 84%.
Disponível em: <https://apeoesp.wordpress.com/> Acesso em: 29 Ago. 2014
Prêmio Prefeito Nota 10
Veja educação
Educação brasileira só será boa quando garantir a todos o direito de aprender
Quando o governante determina onde o aluno vai estudar mas não assegura um padrão minimo de qualidade no ensino, ele cria dois problemas
João Batista Araujo e Oliveira
Ensino fundamental (Thinkstock/VEJA)
Ensino de qualidade
Este artigo faz parte de uma série publicada quinzenalmente em VEJA.com sobre os desafios do ensino fundamental no Brasil — e as estratégias para superá-los.
Os textos são de autoria do Instituto Alfa Beto, que promove oPrêmio Prefeito Nota 10, iniciativa que vai identificar e recompensar o município brasileiro que mantém a melhor rede de ensino. A premiação será realizada no segundo semestre.
A maioria dos prefeitos determina em qual escola o aluno deve estudar. Isso se dá quase sempre em função do local de residência. É um critério baseado na eficiência com o objetivo de reduzir transtornos e custos com transportes. Esse critério também permite racionalizar a rede de escolas. Até aí, tudo bem.
O problema começa quando aparecem os resultados. Sempre que os dados de avaliações nacionais são divulgadas, é possível notar que as redes são desiguais. Ou seja, a avaliação de 5º ano de língua portuguesa da Prova Brasil, por exemplo, mostra que existem escolas com 150 pontos, enquanto outras atingem 250 pontos. Isso significa que, quando o prefeito determina onde o aluno vai estudar mas não assegura um padrão minimo de qualidade, ele cria dois problemas.
Leia os artigos anteriores da série
Primeiro, como normalmente as piores escolas estão nos lugares mais carentes, os alunos que mais precisam de escola boa são os mais prejudicados, aumentando as desigualdades socais. Segundo, ao obrigar o aluno a frequentar uma determinada escola em que a qualidade não é garantida, o prefeito tira do cidadão o direito de buscar um futuro melhor.
Esse problema existe em todo mundo, mas há duas diferenças importantes que sugerem caminhos. A primeira é que o nível de desigualdades no Brasil é muito maior do que em outros países, e a quantidade de pessoas nos níveis mais baixos da escala socioeconômica é muito grande. Isso faz com que, em tese, a maioria dos alunos das escolas públicas tenha uma escola igualmente péssima. Na prática não é bem assim, pois cada diferença de 10 pontos na prova Brasil melhora significativamente as chances dos alunos.
A outra diferença é que o padrão de qualidade do ensino nas escolas que atendem as populações carentes na maioria dos países desenvolvidos é muito semelhante – apesar de nem sempre as escolas conseguirem dar o atendimento adequado aos alunos.
Os dados do Pisa ilustram bem esse argumento. Quando se analisa separadamente o desempenho do grupo de alunos mais pobres, uma décima parte do universo de estudantes brasileiros, vê-se que a pontuação média na prova de língua portuguesa é de 340. Os dois grupos da extremidade oposta — os 20% mais ricos, portanto — têm desempenho entre 420 e 470 pontos. Mesmo com uma pontução superior à obtida pelo grupo dos mais pobres, a nota dos mais ricos ainda se encontra aquém da média dos alunos dos países da OCDE (que reúne as nações mais desenvolvidas do mundo), que é de 500 pontos.
O que os dados mostram é que um sistema de baixa qualidade é ruim para todos, mas é ainda pior para os mais pobres, pois esses ficam com suas chances cada vez mais reduzidas.
O desafio proposto pelo Prêmio Prefeito Nota 10 consiste em alterar situação: sempre haverá melhores e piores, sempre haverá escolas que se distinguem e escolas com resultados piores. Mas a pior escola deve ser muito parecida com a melhor, no sentido de assegurar a cada aluno o seu direito de aprender e um padrão de ensino de boa qualidade. E isso requer novas políticas, novas práticas e novas formas de administrar a educação no município.
João Batista Araujo e Oliveira é presidente do Instituto Alfa Beto
Disponível em: <https://veja.abril.com.br/noticia/educacao/educacao-brasileira-so-sera-boa-quando-garantir-a-todos-o-direito-de-aprender> Acesso em: 28 Ago. 2014